22 June 2007

(2006) Saw III


O brilhante Jigsaw, que expõe as suas cobaias cuidadosamente seleccionadas a jogos perversos, mantém-se como o tema de "Saw III", o segundo filme desta saga realizado por Darren Lynn Bousman. Começo por chamar a atenção para os momentos iniciais do filme, onde Eric Matthews, o detective da polícia desempenhado por Donnie Wahlberg no anterior filme, se depara novamente com uma decisão melindrosa.

Curiosamente, esta cena inicial envolve um pequeno pormenor muito semelhante ao que provocou em mim um pequeno surto de ira perto do final do primeiro filme. Acaba por ser importante para o destino da personagem em questão e revela-se novamente como sendo um erro algo grosseiro no argumento do filme. Continuando...

No final de um turno no hospital onde trabalha, uma médica chamada Lynn é raptada pela nossa já conhecida Amanda e levada para um armazém abandonado. Aqui, Lynn tem a oportunidade de conhecer pessoalmente Jigsaw, cujo nome real é John Kramer e se encontra às portas da morte devido a um cancro terminal. É-lhe dito que terá que manter John vivo enquanto Jeff, um outro peão deste jogo, não completar todas as tarefas com que se irá deparar ao longo do seu percurso.

A tortura psicológica e física a que Jigsaw submete os peões deste jogo é quase insuportável, mas tudo faz parte de um grande esquema que nos permitirá constatar as verdadeiras motivações dos seus intervenientes. Alguns irão inclusivamente aperceber-se que foram, desde o início, peões de um jogo do qual pensavam não fazer parte. Temos também a oportunidade de testemunhar como foram planeados e executados alguns dos jogos apresentados no primeiro filme desta saga, o que acaba por ser bastante interessante.

Angus Macfadyen (Jeff) tem uma actuação consistente ao retratar um pai angustiado e consumido pela fúria e pelo desejo de vingança contra todos os que tiveram directa ou indirectamente envolvidos na morte do seu filho na sequência de um atropelamento. Por sua vez, Bahar Soomekh (Lynn) revela alguma incapacidade para controlar a arte de expressão sentimental, atingindo momentos de um quase total esvanecimento emocional e de completa histeria nos timings mais incorrectos.

Tobin Bell (Jigsaw) é, mais uma vez, sensacional. Mesmo passando a quase totalidade do filme deitado numa cama, consegue dominar completamente as cenas em que participa. No seu leito da morte, a perversidade e capacidade intelectual da personagem é transmitida com um requinte delicioso. Alguém que dê um prémio ao homem que se lembrou de escolher Tobin para este papel, se faz favor.

Tenho que cumprir o meu pequeno ritual e referir as atraentes Dina Meyer (Kerry) e Shawnee Smith (Amanda). A primeira tem a sua participação neste filme eloquentemente encurtada, enquanto que a segunda consegue a sua actuação mais consistente até ao momento, coincidindo com um aumento considerável do seu tempo de antena.

Tomando o ponto de vista de Jigsaw, este filme aborda um jogo mais pessoal e que me parece ser mais interessante do que o retratado no seu predecessor. É mantida a utilização de uma espécie de campanha de desinformação constante e bem construída ao longo do filme que permite o despoletar de uma óptima surpresa aquando do seu final. Confesso que me deixou com algumas expectativas que espero ver cumpridas aquando da chegada da conclusão desta franchise.

Se me permitem, gostaria de lançar um pequeno desafio. A página deste filme no IMDb revela indirectamente uma das suas surpresas principais. Tentem descobri-la...

"Hello, Movie Snobs readers. I want to play a game."

Pontuação global: 7,4

20 June 2007

Tears In Rain

E se, com a precisão de um relógio, o nosso organismo estivesse programado para morrer ao fim de um certo tempo de vida e nada pudéssemos fazer para o evitar? Talvez o ideal fosse conseguir encarar esse momento friamente; sem emoções... Um excerto de Blade Runner (1982).

19 June 2007

(2005) Saw II


A carreira pouco ortodoxa de Jigsaw, e os jogos simultaneamente mórbidos e brilhantes que dela fazem parte, continua a ser retratada em "Saw II", que marca a estreia de Darren Lynn Bousman no campo das longas-metragens e o início de uma já longa associação que apenas terminará com a estreia da parte final desta franchise.

Um informador de Eric Matthews, um detective da polícia, morre devido ao seu envolvimento forçado num dos jogos de Jigsaw, que deixa propositadamente no local do crime pistas que permitem a determinação da sua localização de uma forma relativamente fácil. Uma equipa de intervenção da polícia, da qual Eric faz parte, toma de assalto o esconderijo de Jigsaw e, após terem o controlo da situação, são confrontados com a revelação dos primeiros indícios do já conhecido jogo principal.

O filho de Eric, o jovem Daniel Matthews, encontra-se preso num local desconhecido juntamente com sete outras pessoas, com um total de quatro homens e quatro mulheres. A porta de saída deste local será aberta no espaço de três horas, mas este grupo de pessoas apenas tem duas horas de vida, dado que se encontram a inalar um gás nervoso letal desde o momento em que foram colocados no dito local. Todas as doses do respectivo antídoto apenas estão ao alcance dos que conseguirem superar as sucessivas surpresas preparadas por Jigsaw para os seus peões neste interessantíssimo jogo de xadrez. E que surpresas...

Entretanto, Eric assiste dolorosamente aos acontecimentos que se vão desenrolando no esconderijo e vê-se forçado a participar nos jogos psicológicos a que Jigsaw o sujeita com o único objectivo de reaver o seu filho. Amanda, a única sobrevivente à data dos jogos de Jigsaw, faz parte do grupo colocado no dito local e, como já tinha referido na review do primeiro filme, irá desempenhar um papel fundamental em todo o processo retratado no filme.

Donnie Wahlberg (Eric Matthews), irmão mais velho do intenso Mark Wahlberg, tem um excelente desempenho ao retratar um polícia que recorre a todos os meios necessários para colocar criminosos atrás das grades e que se encontra emocionalmente instável devido ao processo de divórcio que atravessa e à má relação que mantém com o seu filho Daniel. Embora adoptando um estilo um pouco diferente do seu irmão, Donnie parece estar a transformar-se num actor com as características necessárias para a representação de personagens complexas e compostas por várias camadas emocionais.

Em contraste absoluto surge Erik Knudsen (Daniel Matthews), que tem um papel extremamente discreto. Eu diria que foi discreto ao ponto de, em determinadas secções do filme, nem sequer darmos pela presença dele... Com as excepções que se seguem, o restante elenco limitou-se a cumprir o que lhe foi pedido, não havendo lugar a qualquer destaque especial.

Tobin Bell (Jigsaw) é espantoso, conseguindo transmitir na perfeição a natureza calculista e cínica, a perversidade moral e a intensidade intelectual que caracterizam esta personagem. A sua escolha para este papel foi simplesmente genial. Não posso deixar de referir as muito atraentes Dina Meyer (Kerry) e Shawnee Smith (Amanda). Esta última destaca-se também pelo seu papel fortíssimo que sobressai facilmente num autêntico marasmo de talento do restante elenco, ressalvando as referências positivas que tive a oportunidade de fazer nos parágrafos anteriores.

A situação retratada neste filme pareceu-me ser menos interessante que a que havia sido apresentada no seu predecessor e terá sempre que ser tido em conta algum desvanecimento do choque inicial provocado pelos métodos a que Jigsaw recorre. No entanto, as várias surpresas que aguardam os espectadores são deliciosas e a tremenda simplicidade com que nos são mostradas ao longo do filme (embora sempre sob um disfarce bem pensado) providencia um sentimento de satisfação quanto se atinge o seu final.

Pontuação global: 7,2

17 June 2007

(2004) Saw


Dois homens acordam em lados opostos de uma casa-de-banho imunda. Os seus tornozelos estão acorrentados à canalização externa da divisão onde se encontram e entre eles está um homem morto, envolto no seu próprio sangue e em cujas mãos se encontram um mini-leitor de cassetes e um revólver. Esta é a premissa de "Saw", a primeira longa-metragem comercial de James Wan e o filme que o colocou no mapa dos realizadores de terror em Hollywood (a sua primeira longa-metragem foi "Stygian", um filme independente apresentado em 2000 no Melbourne Underground Film Festival).

Os dois homens nos quais a estória se centra são Lawrence Gordon, um médico especialista em Oncologia, e Adam, um jovem fotógrafo freelancer. Após uma fase inicial de choque, ambos descobrem no bolso de trás das calças uma cassete cujo formato coincide com o leitor já referido. Após ouvirem o conteúdo das cassetes, a situação em que se encontram torna-se clara. Ambos são peões num pequeno jogo orquestrado por um assassino apelidado de Jigsaw pela polícia e imprensa. Lawrence é confrontado com uma escolha devastadora: ou mata Adam até às 6:00 horas ou a sua esposa e filha morrem.

Por intermédio de uma sequência de flashbacks, é-nos fornecida uma ideia do modus operandi adoptado por Jigsaw. Na verdade, este não mata as suas vítimas directamente, forçando-as antes a participar em pequenos jogos, perfeitamente estruturados e adaptados ao(s) indivíduo(s) a que se destina(m), nos quais o objectivo é sobreviver a qualquer custo. Compete a cada um destes peões demonstrar a sua vontade de viver, recorrendo ao instinto primitivo de sobrevivência que se encontra latente em todos nós.

Entre todos os flashbacks apresentados, o mais interessante é, sem dúvida, referente a Amanda, uma jovem toxicodependente que se vê subitamente envolvida num dos jogos de Jigsaw e confrontada com uma engenhoca denominada reverse bear trap. Quem já viu o filme sabe ao que me estou a referir; para aqueles que ainda não tiveram a oportunidade de o fazer, a minha pequena referência não estragará quaisquer surpresas que o filme possa vir a trazer.

No que diz respeito aos actores, Cary Elwes (Lawrence) e Leigh Whannell (Adam) são as duas principais personagens deste enredo. Whannell foi, juntamente com o realizador James Wan, o autor do argumento e só lamento que não se tenha restringido a esse nível de participação no filme, dado que a sua habilidade como actor é quase nula. Elwes também não esteve particularmente bem, transmitindo a ideia de estar emocionalmente desligado da personagem que estava a desempenhar.

Danny Glover é David Tapp, um detective da polícia que faz parte da equipa encarregue da investigação das mortes relacionadas com os jogos organizados por Jigsaw. Infelizmente, e mais uma vez, Glover relevou-se incapaz de dar a profundidade necessária para retratar correctamente uma personagem algo complexa e sombria. Uma prova adicional do porquê de nunca ter sido um actor de primeira linha ao longo da sua já longa carreira.

O grande destaque vai para Tobin Bell no papel de Jigsaw. O tom de voz que utiliza nas diversas gravações áudio apresentadas ao longo do filme é suficientemente sinistro para despertar um sentimento de desconforto em qualquer audiência que entre no espírito do filme. O longo repertório de vilões que desempenhou terá facilitado a sua preparação pessoal para esta personagem. Embora o seu tempo de antena aumente drasticamente nos restantes filmes desta franchise, a sua voz, por si só, contextualiza o filme num ambiente mórbido e desconfortável.

Uma pequena referência para Dina Meyer (Kerry) e Shawnee Smith (Amanda), duas mulheres muito atraentes cuja participação nesta saga não se restringe a este filme, com especial ênfase em Amanda, cuja influência no desenvolvimento dos acontecimentos abordados nos restantes filmes é crucial. Mas mais não digo...

Existe um pequeno pormenor que me deixou extremamente irritado, pois é determinante para o despoletar do climax do filme na sua fase final e acaba por ser um erro grosseiro e clamoroso no argumento do filme. Da minha perspectiva, este "pequeno" detalhe fez com que o filme perdesse alguma consistência, embora mantenha a opinião de que se trata de um bom filme de terror com um elevado nível de perversidade equilibrada como já não tinha a oportunidade de ver de há algum tempo a esta parte.

Pontuação global: 7,6

09 June 2007

(1997) Cop Land


"Cop Land" gira em torno de Freddy Heflin, o xerife da pequena cidade de Garrison em New Jersey. Heflin é uma espécie de herói local por ter salvo a vida de uma mulher cujo carro caiu de uma ponte e se afundou num rio. Durante o salvamento, perdeu por completo a audição no seu ouvido direito, deitando por terra o sonho que tinha de ser um agente da polícia de New York, não conseguindo sequer um emprego de secretária nesta instituição.

Dada a sua personalidade afável e o seu estatuto de herói, conseguiu um emprego que veio, de certa forma, minimizar a desolação de se ver impossibilitado de atingir o seu principal objectivo na vida. O seu trabalho cinge-se a tarefas insignificantes, dado que a população de Garrison é quase na sua totalidade constituída por polícias da cidade vizinha de New York. No entanto, esta comunidade foi construída através do estabelecimento de ligações entre os agentes da polícia que a fundaram e a máfia nova-iorquina.

Tudo corre dento da normalidade até ao dia em que Murray 'Superboy' Babitch, um agente da polícia de New York no regresso a Garrison vindo de uma despedida de solteiro, se vê envolvido numa disputa rodoviária, em plena ponte George Washington, provocada por dois jovens negros, aquando por os atingir mortalmente após o que lhe pareceu ter sido um tiro disparado sobre o seu carro.

A série de eventos desencadeados após o sucedido é investigada por Moe Tilden, um agente da secção de Assuntos Internos da polícia de New York que encara esta situação como uma lufada de ar fresco na investigação que já conduzia há muitos anos relativamente a polícias corruptos residentes em Garrison, liderados por Ray Donlan, o tio de Murray.

Sylvester Stallone (Freddy Heflin) tem claramente, neste filme, o melhor desempenho de toda a sua já longa carreira. Curiosamente (ou talvez não...), foi necessário afastar-se do seu estilo habitual de filmes para atingir um nível de actuação que considero significativo e quase cativante. Robert De Niro (Moe Tilden) apresenta-se com um papel fortíssimo que me pareceu ter sido demasiado curto, não só devido ao impacto que teve nas cenas em que participou (o estilo rude e directo a que o magnífico De Niro já nos habituou), como também pela importância que a personagem que desempenha tem no desenvolvimento de toda a estória contada.

Harvey Keitel (Ray Donlan) é o fundador da comunidade policial em Garrison e traz uma enorme solidez a uma personagem que, acima de tudo, representa a velha questão de os fins justificarem os meios, tendo tomado decisões que o tornaram num polícia corrupto que é adorado por uns e odiado por outros com a mesma intensidade. Ray Liotta é Gary Figgis, um dos primeiros polícias a estabelecer a sua residência em Garrison e aquele que tem uma relação mais próxima com Heflin, podendo mesmo dizer-se que será a única personagem a revelar algum respeito e a ter o que se poderá apelidar de amizade com este último.

O principal defeito do filme diz respeito ao seu argumento, pois, embora esteja muito bem escrito, a estória retratada é algo curta e bastante previsível. Uma consequência deste aspecto é a presença de flutuações de ritmo constantes que salientam em demasia as ligações entre os diversos segmentos da estória. No entanto, James Mangold soube rodear-se de um elenco excelente que conduziu este filme do início ao fim de uma forma quase impecável, contribuíndo em muito para a diluição dos defeitos previamente abordados.

Pontuação global: 7,4