14 August 2008

A prepotência dos pseudo-intelectuais

Decidi consultar hoje a secção do site do Público dedicada ao cinema com o intuito de saber os horários das sessões do filme "Wall.E", que tenciono ver assim que for possível. Num momento de curiosidade mórbida, dei uma vista de olhos à secção que contém as críticas dos críticos residentes do jornal O Público. Nunca escondi de ninguém o meu desacordo total com as opiniões manifestadas por estes críticos e pela forma como estas são construídas e apresentadas, mas hoje deparei-me com o que entendo ser a maximização da degradação intelectual de um dos seus elementos, o Sr. Luís Miguel Oliveira.

Tive a oportunidade de ler a "crítica" ao filme "The Dark Knight". Foi escrita no dia 24/07/2008 e embora vá transcrever o seu conteúdo e comentá-lo por segmentos, deixo de seguida o respectivo link:

http://cinecartaz.publico.clix.pt/criticas.asp?c=4585&id=204254&Crid=1

Pesadão e insosso, pelo menos tanto quanto o precedente episódio, se alguma utilidade este "Batman" tem é a de confirmar que Christopher Nolan, tirem-lhe os "truques" (a irritante "história ao contrário" de "Memento" ou a bem aproveitada "noite branca" do Alasca em "Insónia", o seu melhor filme), é um realizador fundamentalmente indistinto e académico.

Acredita verdadeiramente que o Christopher Nolan é um realizador "fundamentalmente indistinto e académico"? Será que tem a mínima consciência do que afirmou? No contexto específico do universo do Batman, teria sido melhor caso tivesse permanecido no ambiente colorido e exagerado que pautou todos os filmes que antecederam "Batman Begins"? Nolan assumiu desde cedo a sua abordagem a este super-herói: estamos perante um homem perturbado e bilionário que usa o dinheiro ao seu dispôr para se vestir de morcego e combater o crime da cidade em que habita. Isto é enquadrável no mundo em que vivemos! É palpável!

Um efeito down to earth tirou a figura mítica Batman de um plano existencial superior ao nosso e inseriu-a no nível em que os comuns mortais se encontram e de uma forma rude e visceral. E conseguiu fazê-lo de uma forma brilhante e unanimemente reconhecida pela crítica. Sim, a verdadeira crítica que se dedica ao estudo da Sétima Arte e que, ao expressar a sua opinião, fá-lo de forma sustentada com base em argumentos válidos com os quais podemos ou não concordar, mas que forçosamente teremos que aceitar dada a sua natureza coerente e lógica.


Não há uma única cena que fique na retina (pudera: o argumento é tão complicado que nem há tempo para respirar, quase todas as cenas são explicativas e parece que só existem para justicar a cena seguinte, num interminável processo de constante adiamento - perguntamo-nos no fim se o filme chegou a começar) e passa-se pelas boas ideias como cão por vinha vindimada (o décor urbano realista e diurno, desperdiçado de maneira, pelo menos num ou dois planos, bastante frustrante).

Era precisamente suposto não termos tempo para respirar. A ideia era transmitir ao espectador (com as devidas limitações) a sequência alucinante de acontecimentos que marcam a estória relatada. Encare o filme como um metrónomo cujo ritmo foi imposto pela personagem do falecido Heath Ledger. O Joker é um ser imprevisível que faz as várias engrenagens que sustentam o mundo que o rodeia girarem a uma velocidade imprevisível e desconfortável.

Por que é que achou o argumento complicado? Por que é que achou que "quase todas as cenas são explicativas e parece que só existem para justificar a cena seguinte"? Percebe onde quero chegar com esta linha de raciocínio? É extremamente fácil apontar o dedo (sempre foi e sempre será), mas justificar o porquê de se fazerem determinadas afirmações só está ao alcance daqueles que sabem conviver com os seus iguais em sociedade.

Se tivesse prestado um pouco mais de atenção a este filme e ao seu antecessor, poderia ter reparado numa progressão intencional entre o ambiente estabelecido em "Batman Begins" e aquele que nos é apresentado nesta nova etapa. Não houve qualquer desperdício, mas sim um tremendo aproveitamento das cenas outdoors como nunca antes se tinha visto num filme deste género. Para mais, não percebo a sua insistência em articular as frases como se estivesse a escrever um telegrama.


Salva-se deste pastelão Heath Ledger: podem dizer estamos influenciados e predispostos a achá-lo porque o rapaz morreu, mas é um facto que o seu Joker é muito bom. Pena ter à volta um filme tão mau.

Soube identificar o ponto alto do filme: Heath "The Joker" Ledger. Os meus parabéns. Agora etiquetar o filme de "tão mau" só demonstra que tem algum tipo de ódio pessoal a algo relativo a este filme... ou mais ainda. Vou reformular esta pequena dúvida sob a forma de uma pergunta de escolha múltipla:

O Sr. Luís Miguel Oliveira odeia:
[ ] A personagem Batman e, consequentemente, todo o seu
        universo
[ ] O realizador Christopher Nolan, motivado por pura inveja
        do seu tremendo talento e sucesso
[ ] O cinema em geral, dado que não trabalha na indústria
        do cinema por culpa do resto do mundo
[ ] All of the above

Sou um acérrimo defensor da liberdade de expressão, mas fico um pouco irritado quando indivíduos da nossa sociedade fazem um uso indevido de um direito que não podemos considerar como adquirido e pelo qual os nossos antepassados lutaram arduamente.

Perante as acusações (e alguns ataques pessoais) que ficaram para trás, passo a estabelecer as bases que me levaram a escrever este post. A diferença fundamental entre os snobs residentes deste blog e os pseudo-especialistas em cinema d'O Público é que nós assumimos abertamente que somos amadores e escrevemos o que queremos. Gostamos de cinema o suficiente para deixarmos as nossas opiniões escritas. Não temos uma obrigação perante a sociedade de estarmos a fazer o que se classificaria de "um bom trabalho", pois não somos expostos às pessoas; são elas que decidem se querem ou não ler aquilo que aqui escrevemos, dado que as nossas opiniões têm o valor que lhes for dado e apenas as próprias pessoas terão a capacidade de ajuizar acerca dos méritos ou deméritos de um filme.

Mas pessoas como o Sr. Luís Miguel Oliveira são remuneradas para providenciar um serviço aos seus leitores. Pegando no exemplo deste filme, ao serem redigidas críticas como o belo exemplar que acabei de dissecar, apenas estão a demonstrar o quão ridículos são e, mais grave que isso, estão pura e simplesmente a dar origem a uma onda de contra-informação relativamente à qualidade dos filmes que vão passando pelas salas de cinema nacionais. Se um dos snobs escrever uma crítica má acerca de um filme, não vai afectar ninguém. Mas se escrevêssemos para um jornal, a conversa mudaria obviamente de tom, pois estaríamos a expôr a nossa opinião perante um conjunto considerável de leitores que poderiam optar por se basearem única e exclusivamente no que havia sido escrito para decidir se um filme seria ou não interessante o suficiente para merecer um investimento monetário num bilhete de cinema, um aluguer num clube de vídeo ou a compra do filme em DVD.

Um dos exemplos que não me canso de referir é o "Fight Club". Eu e o snob fnunes já falámos em diversas ocasiões sobre este filme. Eu considero-o uma obra de arte e um dos melhores filmes de sempre, enquanto que o fnunes simplesmente detestou o filme! No entanto, fomos capazes de apresentar argumentos lógicos para sustentar as nossas opiniões divergentes! Não se pode simplesmente lançar um chorrilho de acusações sem qualquer tipo de justificação, por muito ténue que esta seja. Pessoalmente, apelido esse tipo de atitudes de pura cobardia.

Ao ter lido algumas críticas do Sr. Luís Miguel Oliveira num passado algo longínquo, apercebo-me rapidamente que continua a recorrer à mesma abordagem na interpretação dos filmes que visiona, que é aquela tipicamente associada a quem leva uma existência frustrada por "não estar do outro lado das trincheiras", se me permitem a expressão. Estarei a catalogá-lo facilmente num dos estereótipos mais fortes da indústria cinematográfica? Talvez esteja, sim. Mas faço-o com devido fundamento, pois quem não é capaz de admitir que gostou de qualquer filme que seja, não pode ser outra coisa que não um film school reject.

PS: um grande obrigado ao fnunes por ter contribuído decisivamente para o texto que acabaram de ler.

PS2: em jeito de birrinha pela inconsideração que o jornal O Público teima em demonstrar pelos seus leitores ao permitir que pessoas como o Sr. Luís Miguel Oliveira tenham um espaço fixo de opinião, na qualidade de fundador deste blog irei retirar permanentemente da secção Snobbish Links a ligação para o Cine Cartaz.

10 August 2008

(2005) Hostel


Paxton e Josh, dois amigos universitários norte-americanos, viajam pela Europa como backpackers, conhecendo em Paris um outro jovem que se junta ao grupo, o islandês Oli. Para os jovens estudantes, esta é uma oportunidade única de terem umas férias recheadas de sexo, drogas e experiências que nunca esquecerão. Tendo começado em França e passado por Suíça e Bélgica, chegam à bela cidade de Amesterdão, hospedam-se num hostel e dirigem-se de imediato para o famoso Red Light District para uma longa noite de diversão. Ao regressarem ao hostel, deparam-se com a porta fechada e reparam que não cumpriram a hora de recolher obrigatório em vigor. Dada uma pequena revolta popular na rua onde se encontram devido ao barulho que estão a fazer, e perante as sirenes da polícia cada vez mais próximas, decidem fugir em direcçao ao apartamento de um jovem chamado Alexei que lhes acena da janela.

Paxton e Josh contam a Alexei o plano de irem para Barcelona com Oli, dado que este tem alojamento grátis na cidade e conhecimentos do sexo oposto interessantes. Perante isto, Alexei sugere uma visita a um hostel nos arredores de Bratislava, capital da Eslováquia. O chamariz lançado é que as raparigas que por lá andam são das mais bonitas e promíscuas da Europa, e adoram rapazes de nacionalidade americana. Como seria de esperar, o grupo de aventureiros aceita a sugestão e segue viagem em direcção ao mítico hostel. Ao chegarem ao destino pretendido, deparam-se com uma vila calma e bonita e, acima de tudo, o hostel supera o que lhes havia sido prometido. Logo após a sua chegada, conhecem Natalya, Svetlana e Vala, três jovens atraentes que prontamente se oferecem para lhes mostrar a vila e outras facetas da vida naquele local.

Após a primeira noite de festa, Oli desaparece em circunstâncias misteriosas, não deixando qualquer aviso quanto ao seu paradeiro. Paxton e Josh tentam contactá-lo por telefone, mas sem sucesso. Com o passar das horas, começam-se a aperceber que algo de errado se passa naquele local. Longe estavam estes jovens de saberem que tinham acabado de cair na alçada de um clube conhecido como Elite Hunting, especializado em oferecer a pessoas de posses financeiras elevadas a possibilidade de assassinarem seres humanos, sendo-lhes dada liberdade total na escolha do percurso a adoptar para atingir o objectivo pretendido. De facto, umas férias inesquecíveis...

"Hostel" é a segunda longa-metragem do jovem realizador Eli Roth, que foi também o autor do argumento. Embora o conceito subjacente à estória seja interessante, foram cometidos demasiados erros (ao nível da escrita e direcção) que levaram o filme a assumir um rumo que defraudou as expectativas lançadas no início da sua promoção. Este filme foi classificado de porno gorefest por muitas pessoas e concordo em parte com a questão do sexo. Um componente vital da estória é a utilização do sexo fácil para atrair os jovens até ao hostel e teriam que ser mostrados alguns dos processos pelos quais estes últimos seriam "pescados", mas o constante bombardeamento com cenas de nudez e relações sexuais acaba por dar um aspecto "barato" ao filme. Nem sempre é preciso mostrar tudo para se fazer passar uma mensagem ou uma ideia.

A estória aparenta ser uma manta de retalhos que é unida consoante o conteúdo das cenas e não é capaz de transmitir uma sensação de fluidez ou continuidade. Algumas das cenas incluídas ultrapassam a linha divisória entre o minimamente credível e o ridículo. Sempre me disseram que não se deve brincar com moto-serras, mas um acidente como o ilustrado numa cena específica pareceu-me overkill. Ficou mesmo a sensação que o objectivo da cena seria induzir um pequeno riso nos espectadores, embora se trate supostamente de um filme de terror... Não era de todo necessário entrar no campo do ridículo para tornar o filme visceral.

Em relação ao elenco, os principais intervenientes cumpriram o que lhes foi pedido. A interacção entre as personagens foi superficial e, perante a ausência de diálogos consistentes, os actores em questão não tiveram ao ser dispôr um suporte escrito que pudesse servir de rampa de lançamento para um conjunto de actuações agradável ou minimamente credível. Para os amantes de slasher flicks, e como já tinha deixado a entender, a quantidade de tits 'n' ass é generosa e a sua qualidade acima da média, sendo Barbara Nedeljakova (Natalya) o seu ponto alto.

Em suma, o filme poderia ter oferecido outro tipo de conteúdo mais adequado ao que se propunha ser. O desenvolvimento das principais personagens foi claramente posto de parte em detrimento de uma sequência interminável de cenas de nudez e sexo. Isto impossibilitou qualquer tipo de relacionamento emocional com o que supostamente seriam os heróis da estória. Cheguei mesmo a desejar que sofressem até não poderem mais, dado o comportamento arrogante que sempre demonstraram desde o início.

Como nota, caso estejam interessados em experimentar a gama de serviços apresentada neste filme, bastará enviar um e-mail para o endereço blatanikov@gang.rus

I always wanted to be a surgeon.

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