08 September 2007

(1992) Glengarry Glen Ross


Uma agência de venda de terrenos localizada em Chicago atravessa momentos complicados devido às circunstâncias menos favoráveis em que o seu mercado alvo se encontra envolto. Numa tentativa de melhorar os rendimentos do seu departamento de vendas, os seus donos, Mitch e Murray, promovem uma pequena sessão de incentivo num dos escritórios de vendas. Esta pequena palestra é dada por Blake, um funcionário da firma, sendo o seu público os quatro vendedores de serviço (Ricky Roma, Dave Moss, Shelley Levene e George Aaronow). É-lhes apresentada uma nova adição ao concurso de vendas que decorre actualmente no escritório. Os dois primeiros prémios são os mesmos, ou seja, os funcionários com o maior valor acumulado de vendas são presenteados com um Cadillac Eldorado e um conjunto de facas de carne, respectivamente. O terceiro prémio é o despedimento imediato.

Todos os vendedores são assim obrigados a conseguirem o maior número possível de vendas com base em pistas antigas e fracas, com o vencedor do concurso a ser premiado com as novas pistas de elevado valor denominadas Glengarry (neste contexto, pistas são cartões com nomes e contactos de pessoas que terão a capacidade financeira para se tornarem potenciais compradores de terras, caso sejam convencidos a isso pelos vendedores que as contactam). Os vendedores vêem-se subitamente pressionados para serem bem sucedidos, sendo a situação em si adicionalmente potenciada não só pelos seus problemas pessoais e profissionais, mas também pelos objectivos e intenções pessoais de alguns deles.

"Glengarry Glen Ross" é baseado na aclamada peça de teatro de David Mamet, com a qual venceu um prémio Pulitzer. Mamet é um argumentista e realizador brilhante cuja imagem de marca é a forma dura e directa com que as suas personagens interagem com o meio em que se encontram inseridas por intermédio de diálogos rudes e magnificamente elaborados, tornando-as extremamente credíveis e plausíveis. Muitos apontam a utilização excessiva e desnecessária de palavrões por parte de Mamet neste filme, e na sua escrita em geral. Mas esta questão parece-me perfeitamente justificada, contribuíndo para a contextualização das estórias e a sua aproximação ao que nós consideramos "real". É uma imagem de marca de Mamet e este é globalmente considerado como um dos maiores escritores vivos de peças e argumentos na língua inglesa. Esta estória contém algumas das melhores personagens do cinema produzido no decurso do século XX.

Com o próprio Mamet encarregue de adaptar a sua peça para o grande ecrã, a realização ficou a cargo de James Foley, um realizador com uma carreira muito discreta e ao longo da qual apenas consigo destacar Confidence para além deste filme. Neste caso específico, fez um excelente trabalho ao orientar de forma brilhante um elenco recheado de estrelas, o que nem sempre é trivial de conseguir. A iluminação é excelente e o trabalho efectuado com as cameras é simplesmente fantástico, com uma utilização quase deliciosa de diferentes ângulos que permitem ampliar os desempenhos dos vários actores, salientando pormenores específicos nas cenas apresentadas.

É bastante interessante que Foley nunca se tenha tornado num dos realizadores de primeira categoria em Hollywood após ter criado este filme soberbo. Existem algumas teorias da conspiração relativamente a este assunto e, pessoalmente, concordo com duas delas. A primeira refere que Mamet terá participado activamente na realização do filme, não se tendo restringido à escrita do guião; a segunda aponta para uma liberdade quase total dos actores para desempenharem os respectivos papéis, visto que apenas Pacino e Baldwin nunca tinham participado na peça de teatro.

O elenco é apenas um dos melhores alguma vez colocado à frente de uma camera e os seus protagonistas são os seguintes:
  • Al Pacino é Ricky Roma, um homem arrogante e frontal cuja capacidade de conversação claramente acima da média faz dele o melhor vendedor do escritório. Mantém sempre algum distanciamento dos restantes vendedores do escritório. Um excelente papel deste "monstro" do cinema que lhe valeu uma nomeação para um Oscar de Melhor Actor Secundário.

  • Jack Lemmon é Shelley Levene, um vendedor cuja alcunha é The Machine. Embora seja uma espécie de herói local no departamento de vendas, a sua capacidade empreendedora encontra-se numa curva acentuadamente descendente e, ao ser confrontado com a possibilidade de vir a ser despedido, entra em pânico, visto que necessita de dinheiro para pagar o internamento da sua filha numa instituição médica. Lemmon era um actor com um talento natural para papéis dramáticos e aqui teve a oportunidade de representar uma personagem à sua medida. É o segundo melhor desempenho do filme e acaba por ser a figura central de todo o enredo.

  • Kevin Spacey é John Williamson, o chefe do escritório e responsável por todo o trabalho administrativo e burocrático associado à venda de terrenos. Sem qualquer experiência em vendas, é constantemente insultado e humilhado pelos seus supostos subordinados por não ser mais do que uma marioneta dos seus chefes. Um óptimo desempenho de um grande actor que estava a começar a despontar no grande ecrã aquando do lançamento deste filme.

  • Ed Harris é Dave Moss, um homem revoltado e frustrado com a sua situação actual e capaz de praticamente tudo para satisfazer os seus objectivos e desejos pessoais. Encontra-se à beira de uma explosão emocional por não ser muito bem sucedido a nível profissional. Um desempenho extremamente forte e intenso na representação de um homem cuja forma de ser assenta no ódio.

  • Alec Baldwin é Blake, um motivador a quem é pedido que dê uma pequena palestra aos funcionários do escritório de vendas retratados nesta estória, com o objectivo de os encorajar a vender propriedades. Baldwin surge em apenas uma cena do filme cuja duração é aproximadamente sete minutos, mas consegue ser o melhor desempenho do filme e, curiosamente, tem aqui a melhor representação de toda a sua carreira. O seu discurso é ofensivo, rude, violento, provocador e incendiário. É simplesmente fantástico e eu arriscaria mesmo a dizer que é um dos melhores desempenhos de sempre captados em filme.

  • Alan Arkin é George Aaronow, a personagem mais caricata da estória. É um vendedor inseguro, indeciso e desmotivado e que tem a tendência irritante de repetir tudo o que lhe é dito por outras pessoas. Profissionalmente, é um caso perdido, nunca tendo sido bem sucedido e sem qualquer hipótese de o vir a ser num futuro próximo ou distante. O recém-vencedor de um Oscar tem aqui um excelente papel.

Não tendo conhecimento da forma de funcionamento das escolas de cinema mais prestigiados nos E.U.A., penso que este filme deveria ser considerado um exemplo a seguir e mostrado a todos os alunos que sejam aspirantes a argumentistas e actores. Em suma, um filme fantástico que fará para sempre parte da minha lista de favoritos, não apenas pela qualidade do filme em si, mas acima de tudo pelo argumento fantástico e as actuações maravilhosas do elenco.

You got leads. Mitch and Murray paid good money. Get their names to sell them. You can't close the leads you're given, you can't close shit, you are shit! Hit the bricks, pal, and beat it, 'cause you are going out!

Fuck you... that's my name! You know why, mister? 'Cause you drove a Hyundai to get here tonight. I drove an $80.000 BMW. That's my name!

Pontuação global: 8,1

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