30 July 2007

(2006) Children of Men



Em 2027, um jovem com 18 anos é assassinado. Isto não seria notícia, senão pelo facto de ele ser a pessoa mais jovem do planeta.

Realizado por Alfonso Cuarón, Children of Men decorre num futuro apocalíptico no qual a Humanidade se tornou infértil. Poluição? Experiências genéticas? Cólera divina? Sem respostas, e sem perspectivas de futuro, a sociedade colapsa. Como se vê escrito numa parede: The last one to die please turn out the light.

A estória desenrola-se no Reino Unido, talvez o último local onde ainda existe alguma forma de governo, que vive sob um regime fascista onde os imigrantes e refugiados são perseguidos, tudo em nome da Homeland Security. Quaisquer semelhanças com Auschwitz, Abu Ghraib ou Guantánamo não são pura coincidência. Tal como as melhores estórias sobre futuras distopias, esta tem uma mensagem actual.

Clive Owen é Theo Faron, um antigo activista político que é contactado pela sua mulher, Julian (papel desempenhado por Julianne Moore), para que obtenha documentação que permita a fuga a uma jovem refugiada africana, Kee (papel desempenhado por Claire-Hope Ashitey), para um barco-refúgio ao largo da costa.

A importância da missão só se torna patente quando nos apercebemos que Kee está grávida, e que o nascimento da criança pode dar respostas que permitam assegurar o futuro da Humanidade.

O elenco porta-se bem, mas não quero dedicar-lhe mais tempo desta review, além de dedicar uma menção honrosa à participação do grande Michael Caine, que desempenha o papel de Jasper, um amigo de Theo.

O que gostaria de realçar neste filme é o excelente trabalho de câmara, algo que já se tornou numa trademark de Cuarón.

Numa época onde filmes de acção são frequentemente filmados com cuts frenéticos (sim Michael Bay, estou a falar contigo), as cenas contínuas e Children of Men são imensamente poderosas e verdadeiras proezas técnicas. Sinto-me obrigado a mencionar as duas mais marcantes (sem spoilers, espero):
  • A emboscada na estrada é uma única cena de 4 minutos, com a câmara a rodar, a entrar e a sair do carro. Um veículo especial teve que ser construído para permitir todos estes movimentos da câmara sem recorrer a cortes.

  • A corrida pela cidade em guerra é uma única cena que dura uns espantosos 8 minutos (!), com a câmara a entrar e a sair de edifícios, com tiros e explosões a toda a volta. O efeito final é uma sequência que lembra um documentário filmado numa zona de guerra.

Em abono da verdade, devo apontar que estas cenas não foram todas filmadas num único take. Há algum CGI envolvido para ligar vários takes no que aparenta ser uma única cena contínua. No entanto, isto não reduz o impacto do efeito conseguido.

Pontuação global: 8,3

The future is a thing of the past

3 comments:

FNunes said...

As cenas com "cuts frenéticos" têm a vantagem de intensificar a sensação da cena acção, mas ao mesmo tempo gera uma enorme confusão e obriga o espectador a uma ginástica mental complexa por forma a conseguir seguir essa cena. Pessoalmente, detesto-as e não considero que não passam de uma forma de esconder a incapacidade do realizador (Michael Bay não é o único! Muitos mais andam por aí) de filmar cenas de acção continuas.

Deixando os "cuts frenéticos" e falando do filme. Children of Men foi para mim o melhor filme de 2006 (obviamente que não fui ver todos os filmes que estavam nas salas, mas daqueles que fui ver, este foi o melhor).

O que se destaca neste filme é mesmo a cinematografia que está muitíssimo acima da média (este filme demonstra que não é necessário usar uma dúzia de câmaras para filmar uma sequência de acção), colocando-o como sério candidato a se tornar um clássico, não só da ficção científica, mas da 7ª arte em geral.

De notar que embora de renome, o filme não vive da fama dos actores (mais uma vez, todos os filmes deveriam ser assim).

Como pontos negativos tenho de salientar que tanto o inicio como o final do filme poderiam estar melhores.

Boa review!

Anonymous said...

Tive a oportunidade de ver este filme hoje e mantenho tudo o que já foi dito. No âmbito dos filmes lançados em 2006, este está claramente entre os cinco melhores filmes do ano.

START OF SPOILERS!

Não posso deixar de mencionar a cena em que ocorre um parto, a qual foi extraordinariamente bem conseguida. Outro pormenor a salientar diz respeito à atracção que Theo gera nos animais com os quais tem contacto (principalmente cães e gatos). Talvez seja um indicador indirecto da pureza de alma de Theo, visto que os animais são vistos como detectores de maldade em muitas crenças.

END OF SPOILERS!

Por fim, não podia deixar passar esta oportunidade sem expressar a forma brilhante como a nossa sociedade é retratada nesta estória. Vivemos num mundo em que os "bons da fita" simplesmente não existem e no qual o conceito de "bem" pode ser definido como sendo a ausência de "mal". Um governo opressor e totalitarista é combatido por um movimento de resistência cheio de boas intenções. O problema aqui é que as boas intenções nunca trouxeram nada de bom e esta resistência, na sua essência, apenas ambiciona assumir o poder e impôr um regime totalitarista cujo propósito é impedir que se voltem a verificar situações como a trazida pelo governo agora deposto. Desta forma, a nossa sociedade funciona como o pobre cão cujo único objectivo num particular momento da sua vida é perseguir a própria cauda.

Uma última palavra para os idiotas que continuam a criticar a recente onda de "anti-heróis" nos filmes, ao mesmo tempo que defendem o retorno dos bons velhos heróis de antigamente, que defendiam os valores da justiça e liberdade. Vejam lá se abrem os olhos e se aprendem finalmente a lição do dia: os heróis não existem e aqueles que apelidam de "anti-heróis" são apenas humanos.

Pontuação global: 8,1

@jsilva,
Excelente review!

@fnunes,
Não percebi porque é que o início e o final do filme poderiam estar melhores. A contextualização do estado actual da sociedade pareceu-me ter sido feito de uma forma bastante eficaz nos primeiros 3 minutos do filme. Quanto ao final, pareceu-me estar destinado a que terminasse assim. Do meu ponto de vista, nem faria sentido se terminasse de outra forma que não a apresentada.

FNunes said...

@PinkyBrain
Já vi o filme à algum tempo, e já não me recordo bem como foi o inicio, mas sei bem o que quero dizer com o fim podia estar melhor.

Spoilers





O fim seria de maior qualidade se ela cantasse algo para o bebé ao mesmo tempo que o écran ia escurecendo até aparecer a frase final. Um pequeno detalhe que na minha opinião aumentaria a qualidade da cena final.